Como É que Eu Sei? O Desafio da Modernidade

[Mais um artigo que publiquei primeiro em meu outro blog “Liberal Space” (http://liberal.space)%5D

1. O Conhecimento Face à Dúvida e ao Ceticismo

Consta que Kant, tido como o principal Filósofo da Modernidade, teria um dia escrito que os grandes problemas da Filosofia são (eu adapto):

  • Quem sou?
  • De onde venho?
  • Que faço aqui?
  • Para onde vou?
  • Como é que eu sei?

Desses cinco problemas, o último é o mais básico, porque perpassa os outros quatro — e a si próprio:

  • Como é que eu sei quem sou (se é que de fato eu sei)?
  • Como é que eu sei de onde venho (se é que de fato eu sei que venho de algum lugar)?
  • Como é que eu sei o que faço aqui (se é que de fato eu sei que faço alguma coisa aqui)?
  • Como é que eu sei para onde vou (se é que de fato eu sei que estou a caminho de algum lugar)?
  • Como é que eu sei essas coisas (se é que de fato eu as sei; e se eu as sei, como é que eu sei que sei)?

O problema do conhecimento se tornou uma obsessão para a Filosofia Moderna — a filosofia feita mais ou menos a partir da primeira metade do Século 17. René Descartes é considerado o Pai da Filosofia Moderna, e ele viveu de 31 de Março de 1596 a 11 de Fevereiro de 1650 — quase 54 anos. Ele inventou a “Dúvida Metódica”: colocar em dúvida tudo o que ele achava que sabia. . .

Reconhecer esse fato não implica, de forma alguma, que não tenha havido grandes discussões do problema do conhecimento antes do Século 17. Os gregos, em especial seus dois principais filósofos, Platão (que, provavelmente, nasceu em 428 e morreu em 348, AC, vivendo, portanto cerca de 80 anos) e Aristóteles (que nasceu em 384 e morreu em 322, AC, vivendo, portanto, 62 anos) discutiram muito esse problema — e outros correlatos. Data dessa época a famosa discussão acerca da distinção entre conhecimento (ἐπιστήμη ou γνῶσις) e opinião ou “achismo” (δόξα).

Mas foi no início da Era Moderna que o problema do conhecimento se tornou (para alguns) uma questão (quase) de vida e morte: Como é que eu sei que é a Terra que gira ao redor do Sol e não o Sol ao redor da Terra (como parece aos nossos sentidos e, antes do Século 15, sempre se acreditou)? Consta que Galileu Galilei (1564-1642), quando a Igreja Católica decidiu combate-lo, optou (para escapar da fogueira) por concordar com ela, afirmando continuar a acreditar que era o Sol que girava ao redor da Terra. Mas, para si mesmo, admitiu: “Mas eu sei que é a Terra que se move ao redor do Sol”. . .

Mas a questão epistemológica continuava: “Como é que eu sei que é a Terra que gira ao redor do Sol, quando para os meus órgãos dos sentidos é o Sol que parece girar ao redor da Terra?”. . . Com base em que eu abandono aquilo que eu pareço ver para acreditar numa teoria?

Essa questão foi se radicalizando (embora também essa radicalização tenha raízes gregas). . . Se, neste caso, eu posso deixar de acreditar na minha percepção sensorial, como é que eu sei que aquilo que eu pareço estar vendo na minha frente em qualquer ocasião de fato existe numa realidade externa a mim, e não é um simplesmente um “fantasma”, um “fenômeno”, uma “alucinação” que tem lugar exclusivamente na minha mente? Quando eu sonho, refletiu Descartes, eu imagino estar vendo toda sorte de coisas, pessoas, eventos — mas tudo aquilo está apenas dentro da minha mente, enquanto eu durmo, tranquilo, de olhos cerrados, numa cama confortável. Como é que eu sei que minha vida inteira, com todas as suas atrações, peripécias e perigos não é tão somente um sonho de minha mente, sonho que se desenrola enquanto eu durmo numa caminha simples, numa casa não atraente, e nunca realmente vivenciei, de fato, peripécias e perigos?

O problema vai além. . .

Até o início da Idade Moderna a maioria das pessoas acreditava que algumas coisas (estados de coisas, pessoas, etc.) são belas, outras feias. . . e que essas características, beleza e feiura, existem nas próprias coisas, a distinção entre o belo e o feio sendo real e objetiva. Mas várias pessoas, na Idade Moderna, passaram a acreditar que, de fato, “a beleza está no olho de quem olha. . .”. David Hume (1711-1776), filósofo escocês sobre o qual eu escrevi minha tese de doutoramento, de 1970 a 1972, que, segundo alguns, é o maior filósofo da língua inglesa que viveu até hoje, disse “A beleza não existe nas coisas, mas na mente que as contempla”. (Note-se que ele nem diz “na mente de quem as contempla”).

Mas o problema se estende ainda mais. . .

Até o início da Idade Moderna a maioria das pessoas acreditava que algumas ações são moralmente certas e outras, moralmente erradas, e isto em sua própria natureza, enquanto ação, sendo a distinção, portanto, entre ação moral e ação imoral, objetiva e absoluta (“absoluta” querendo dizer que não varia dependendo do tempo, do lugar, das circunstâncias). Mas várias pessoas, na Idade Moderna, passaram a acreditar que o certo e o errado, na moralidade, não está nas ações em si mesmas, mas, como já se reconhece no tocante aos hábitos alimentares, às vestimentas, e a outros usos e costumes, nos gostos e nas preferencias das pessoas, naquilo que elas optam por favorecer, naquilo que elas consideram atraente ou repulsivo, agradável ou detestável. Bertrand Russell (1872-1970), por muitos considerado o maior filósofo da língua inglesa depois de Hume, e por alguns incautos considerado uma das âncoras morais do Século 20, indagado acerca do que, nas ações de Hitler, ele considerava moralmente condenável, esclareceu que aquilo que o levara a se opor a Hitler era o fato de que ele não gostava do que Hitler havia feito. . . (Fica a implicação intrigante e mesmo revoltante: se uma outra pessoa gostasse do que Hitler havia feito, nada haveria, do ponto de vista moral, filosófico ou racional, que pudesse ser utilizado por Russell para convence-la de que estava, de fato, errada — pois gosto não se discute, de gustibus non est disputandum).

Russell era chamado de “O Hume Moderno”. Concordava com seu mestre que, na moralidade, não existem valores reais, objetivos, absolutos, mas apenas meros gostos e preferencias, explicáveis em termos de nossos sentimentos e sensações de atração ou repulsa.

Hume também está na raiz de uma crença ou postura, bastante difundida no Século 20, de que a razão é uma faculdade preciosa, mas que ela é apenas “instrumental”, isto é: opera apenas no “reino dos meios”, não no “reino dos fins”. Assim, dado um fim qualquer, a razão (da qual faria parte a chamada “razão científica”) tem condições de determinar quais os melhores meios de alcança-lo. Mas a razão, sendo instrumental, não tem condições de avaliar se o fim em questão é bom, correto, digno, ou melhor do que qualquer outro fim. . . Se o fim é o poder a qualquer preço, a razão pode ditar os meios a serem utilizados para que esse fim seja alcançado, mas fica silente quanto aos méritos do fim em si. . .

Se é parte da herança da Modernidade que devemos duvidar até mesmo das coisas que observamos, manter-nos céticos até mesmo acerca daquilo que vemos, quanto maior será a dúvida e o ceticismo dos modernos acerca do inobservável, do invisível, daquilo que, por definição, jaz além da observação dos sentidos? Se o natural cai dentro do reino da dúvida e do ceticismo, o sobrenatural e o metafísico ficam totalmente fora do admissível. Aí se incluem Deus, espíritos em geral, ruins ou bons, a alma humana e sua suposta imortalidade. . . Para ser imortal, a alma teria de existir — e como é que eu sei que ela existe, como é que eu sei que, possivelmente, não é apenas o cérebro e o seu sistema nervoso que explica tudo? E se a alma é apenas o cérebro, ela morre com ele e a questão da imortalidade da alma não faz sentido.

2. E a Fé uma Alternativa Viável?

Diante da defesa, por parte da Filosofia Moderna (com o apoio da Ciência Moderna), da dúvida e do ceticismo em relação à religião, em geral, e ao sobrenatural, em particular, ficou difícil, para os teólogos cristãos, continuar a manter a tese de que a razão tem um papel importante na Teologia Cristã.

A. Razão e Fé em Pé de Relativa Igualdade

Tradicionalmente, tínhamos, na Teologia, pelo menos desde Tomás de Aquino (1225-1274), a defesa de uma síntese entre a Razão e a Fé, ou entre a Razão e a Revelação.

Segundo Tomás de Aquino, há basicamente duas formas de conhecer a Deus — e, consequente, de fazer Teologia. Uma, baseada na razão, outra baseada na revelação. Essa tese era importante para ele porque ela permitia que até mesmo os que viveram muito antes do Cristianismo não tivessem desculpa para não acreditar em Deus. A razão humana, desassistida da revelação, e, por conseguinte, da fé, seria capaz de determinar que Deus existe e quais são suas características negativas essenciais (embora a razão não seja capaz de ir além da existência e da negação de algumas características essenciais: Deus não é material, não é corpóreo, não é mortal, não é falível, não é mau, não é ignorante, não é limitado, etc.). Tomás escreveu uma obra inteira apenas desse tipo de Teologia Natural Negativa: a Summa Contra Gentiles.

Para irmos além desse mínimo, é necessário que Deus se revele — e, felizmente, segundo Tomás de Aquino, ele o fez. Essa revelação está contida na Bíblia, que deve ser entendida como a sua palavra. Para Tomás, a Bíblia pressupõe a razão e nunca vai contra ela — indo, porém, além dela, sem a contradizer. Para ele, em relação à razão, é possível diferenciar três tipos de enunciados:

  • Secundum rationem: aquilo que é racional, pois é derivado da razão;
  • Contra rationem: aquilo que é irracional, pois contraria a razão;
  • Supra rationem: aquilo que é não é nem racional (secundum rationem) nem irracional (contra rationem), porque está além da razão (supra rationem), tendo nós boas razões para aceita-lo.

A revelação se encaixa nessa terceira categoria: o conteúdo da revelação não contraria a razão: se aparentar faze-lo, devemos interpreta-lo de outra forma, de modo a que deixe de contrariar a razão.

Não poderíamos nós, diante de algo que não é nem racional nem irracional, simplesmente suspender o nosso juízo e nem aceitar nem recusar, nem crer nem descrer? Tomás é contra essa postura, por pelo menos três razões:

  • Primeiro, porque o conteúdo da revelação, embora não alcançável pela razão, enriquece e apoia o que nossa razão é capaz de descobrir acerca da moralidade, da vida, etc.
  • Segundo, a epistemologia de Tomás de Aquino deixava aberta a possibilidade de milagres, não os definindo como impossíveis, muito menos como incríveis;
  • Terceiro, porque o conteúdo da revelação traz, consigo, evidências de autoria divina, como por exemplo, os milagres que teriam acompanhado essa revelação. [Tomás não se preocupa com o fato de que o relato dos milagres que autenticariam a origem divina da revelação está contido na própria revelação.]

A epistemologia de Tomás é basicamente aristotélica. Ela parte do pressuposto de que somos capazes de conhecer a essência das coisas, isto é, aquilo que elas são em mesmas e aquilo que elas são capazes de fazer por si próprias. Isso vale também para o ser humano. Se algo acontece na realidade que vai além daquilo que qualquer coisa natural (o ser humano incluído) é capaz de fazer, podemos concluir, com convicção e certeza, que a natureza, deixada a si própria, não seria capaz de produzir aquele acontecimento, que, por conseguinte, só pode ser entendido como milagre — que é definido como uma suspensão (não uma violação) das leis naturais.

Segundo Tomás, portanto, tanto a razão como a revelação são fontes legítimas de conhecimento teologicamente relevante (acerca de Deus, da alma, do que é certo fazer, etc.) que convivem pacificamente, sem que uma contrarie a outra. Embora a revelação não seja secundum rationem, ela não é contra rationem, sendo, portanto, racional em um sentido mais fraco: não é derivada da razão mas também não conflita com ela.

Aqui, nessa posição, embora a razão e a fé sejam ambas fontes de conhecimento teológico, o conhecimento de Deus baseado na razão pode, oportunamente, levar à fé. A razão, assim, pode servir como ponte para a fé. Por isso, por vezes essa posição é chamada de intelligo ut credam: entendo, para poder vir a crer.

Uma consequência dessa forma de ver a relação entre razão e revelação é que Tomás acredita que a verdade é una e rejeita a teoria da “dupla verdade”, que, comum na parte final da Idade Média, postula que algo pode ser verdadeiro na Filosofia, mas falso na Teologia, ou vice-versa.

Essa visão de síntese entre razão e revelação (ou fé) tem outra consequência interessante, esta na área da moralidade. Como a revelação divina não contraria a razão, Deus não pode dar comandos morais que sejam contrários à razão — ainda que eles sejam acima da razão.

Isso faz com que, na Teologia Cristã, tenha surgido a tese de que mesmo o próprio Deus está sujeito à moralidade racional. Assim, um curso de ação não é moralmente certo porque Deus o comande — pelo contrário: Deus o comanda porque esse curso de ação é moralmente certo (numa visão racional). De igual modo, um curso de ação não é moralmente errado porque Deus o proíba — pelo contrário: Deus o proíbe porque esse curso de ação é moralmente errado (numa visão racional). Essa é a famosa controvérsia do prohibita quia mala (a conduta é proibida [por Deus] porque é errada) vs mala quia prohibita (a conduta é errada porque é proibida [por Deus]).

B. A Razão como Serva da Fé

Anselmo de Cantuária (1033-1109), que viveu cerca de duzentos anos antes de Tomás de Aquino, tinha uma visão diferente do papel da razão na revelação, e, por conseguinte, na Teologia. Para ele, a primazia era da Revelação — e a razão não passava de uma serva da fé. Essa visão acabou por caracterizar a Filosofia como a serva, a handmaid, da Teologia. As raízes dessa posição, porém, já podem ser encontradas em Agostinho (354-430).

Para ele, a revelação divina não é algo que se entende automaticamente, bastando ler ou ouvir. É necessário, muitas vezes, que a razão intervenha para esclarecer, elucidar, tornar inteligível a revelação. Por isso o seu lema: fides quaerens intellectum (a fé que busca o entendimento). Karl Barth (1886-1968), já no Século 20, escreveu um interessante livro sobre Anselmo, com esse título em Latim. Um outro título para essa posição é credo ut intelligam: creio para que possa vir a entender.

Aqui, dá-se por pressuposto que a revelação está contida na Bíblia e admite-se a necessidade da razão para entender a Bíblia (não para questiona-la).

No Século 19, o grande teólogo reformado americano Charles Hodge (1797-1878) adotou estratégia metodológica mais ou menos semelhante. Para ele, a Teologia é uma ciência — tão rigorosa como a Física. A diferença entre a Teologia e a Física está no fato de que, nesta, os fatos que ela analisa e sistematiza são dados pela observação, enquanto na Teologia eles vêm prontos, empacotados, como se fosse, na Escritura Sagrada. Dados os fatos, o resto — analisar e sistematizar os fatos — é trabalho exclusivamente da razão.

Eis o que ele diz na primeira página de sua obra monumental, Systematic Theology:

“Da mesma forma que a natureza não é um sistema de química ou de física, a Bíblia não é um sistema de teologia. Encontramos na natureza os fatos que o químico e o físico precisa analisar, e, a partir deles, inferir as leis pelas quais eles são determinados. Da mesma forma, a Bíblia contém as verdades que o teólogo precisa coletar, autenticar, arranjar, e apresentar em seu relacionamento umas com as outras. Aqui se encontra a diferença entre teologia bíblica e teologia sistemática. A tarefa da primeira é descobrir e enunciar os fatos contidos na Escritura. A tarefa da teologia sistemática é, com base nesses fatos, determinar sua relação uns com os outros e com outras verdades cognatas, bem como vindica-los, mostrando sua harmonia e consistência. Essa tarefa não é fácil nem de pequena importância” [pp. 1-2].

“A Bíblia é para o teólogo aquilo que a natureza é para o cientista. É o depósito de fatos. E o seu método para averiguar o que a Bíblia ensina é o mesmo método que o cientista adota para averiguar o que a natureza ensina” [p. 10].

“O verdadeiro método da Teologia é, portanto, o indutivo, que pressupõe que a Bíblia contém todos os fatos ou verdades que foram o conteúdo da Teologia, da mesma forma que os fatos da natureza são o conteúdo das ciências naturais. Também se assume que a relação desses fatos bíblicos um para com o outro, e os princípios neles envolvidos, estão contidos nos próprios fatos, e devem ser deduzidos deles, da mesma forma que as leis da natureza são deduzidos dos fatos da natureza. Em nenhum dos dois casos os princípios derivados da mente são impostos sobre os fatos, mas, de igual forma, tanto na teologia como nas ciências naturais, os princípios ou leis são deduzidos dos fatos e reconhecidos pela mente” [p. 17].

Para realizar a tarefa descrita ao final da primeira citação, as duas teologias, a bíblica e a sistemática, fazem uso imprescindível da razão. Mas a razão, por si só, não seria capaz de descobrir os fatos (“as verdades”) que a Escritura revela. O método da teologia é, para Hodge, tão racional e científico quanto o da química e da física. Tanto uma como as outras fazem uso do método indutivo. Mas a razão não descobre fatos, e muito menos os constrói, seja na teologia, seja nas demais ciências. Nestas a descoberta de fatos é feita pela observação; na teologia, os fatos são revelados por Deus e estão contidos na Bíblia.

C. Fideísmo, ou Credo Quia Absurdum

No início da era cristã um teólogo chamado Tertuliano defendia a tese de que os cristãos não devem pretender que a razão seja capaz de descobrir, desassistida pela revelação, os mistérios do Cristianismo. Para ele, não há nada em comum entre Jerusalém e Atenas, entre a Teologia e a Filosofia. Esta lida com o conhecimento, aquela com a fé.

A fé, para ele, não era um estágio anterior ou posterior ao da razão: era algo totalmente distinto. Quando não se tem como justificar um enunciado por um apelo a evidências, ou não se está interessado em faze-lo, a única alternativa é reconhecer que, se aceitarmos esse enunciado, a aceitação terá de ser cega, totalmente pela fé, como um salto no escuro. Afirmar que determinado enunciado foi aceito pela fé, portanto, não é uma forma justificar a sua aceitação: apenas explica que a aceitação foi feita sem apelo a evidências, ou porque se acredita que elas não existam, ou porque se escolheu não leva-las em conta.

Tertuliano chegou mesmo a dizer, ecoando parcialmente o apóstolo Paulo, que acreditava no Cristianismo porque o Cristianismo era absurdo. Kierkegaard (1813-1855), no Século 19, foi quem afirmou que a fé é sempre um salto no escuro: se houver evidência, se houve apoio da razão, ela deixa de ser fé.

Para os que acreditam assim, que normalmente são chamados de Fideístas, os racionalistas do Iluminismo fizeram ao Cristianismo um grande favor mostrando inexistirem argumentos, evidências e boas razões para sua aceitação. Mostraram, assim, que apenas a fé cega, a fé do tipo “salto no escuro”, explica sua aceitação.

Neste caso, a única resposta à pergunta “Como é que eu sei?” é “Eu não sei” — mas resolvi, de qualquer forma, apostar.

No Século 16 Pascal (1623-1662) resolveu mostrar que a aposta, afinal, não é tão cega, tão racional.

Segundo ele, temos basicamente, a seguinte alternativa: Crer ou não crer.

Se não cremos, existem duas possibilidades: o Cristianismo é falso (ou Deus não existe) ou o Cristianismo é verdadeiro (ou Deus existe). Na primeira hipótese, não ganhamos nada não acreditando; na segunda, vamos nos dar muito mal.

Se cremos, também existem duas possibilidades: o Cristianismo é falso (ou Deus não existe) ou o Cristianismo é verdadeiro (ou Deus existe). Na primeira hipótese, não perdemos nada acreditando; na segunda, ganhamos o “jack pot”, o maior prêmio da casa.

Assim sendo, há, segundo ele, boa razão para se apostar, mesmo cegamente, que o Cristianismo é verdadeiro (ou que Deus existe): não perdemos nada se estivermos errados e ganharemos tudo se estivermos certo. Por outro lado, se apostamos que o Cristianismo é falso (ou que Deus não existe), não ganhamos nada se estivermos certos e perdemos tudo se estivermos errados.

Ainda é tempo de apostar. . .

Em São Paulo, 26 de Março de 2015

Transcrito aqui em 8 de Setembro de 2015

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