A Virtualização da Realidade, a Igreja Virtual e os “Desigrejados”

A Virtualização da Realidade

Eduardo Chaves

Nota do Autor (na data de hoje, 5 de Julho de 2017):

Escrevi uma primeira versão do modesto trabalho, cujo título está acima, então com meras duas páginas, em Janeiro de 1993. Faz 24 anos. Dei-lhe o título que manteve durante sua evolução: “A Virtualização da Realidade”. O trabalho foi escrito como material de apoio para um curso sobre “Desenvolvimento de Sistemas de Multimídia e Hipermídia”, que ministrei no primeiro semestre de 1993 na UNICAMP. O caráter simples e didático do texto reflete o fato de que, naquela época, em que a Internet não havia ainda nem chegado ao Brasil, o tema era meio esotérico.

Talvez por causa do ineditismo no assunto, na época, passados seis anos a Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), vendo o artigo em meu site, pediu permissão para publica-lo, com o mesmo título, revista Comunicação & Educação. Naturalmente que dei permissão – e me senti até orgulhoso de que algo despretensioso que havia escrito seis anos antes fosse julgado digno de figurar numa revista da ECA/USP. Fiz uma pequena revisão e enviei o artigo à ECA. Ele foi publicado no nº 16, de Dezembro 1999. Faz quase dezoito anos. Tenho um exemplar da revista. Apenas um.

Agora um grande amigo, Marcelo Girsas, que se tornou amigo naquela época, em Campinas, em contexto totalmente diverso, quando os interesses de um e de outro eram mais voltados para a tecnologia, e que agora mora em Florianópolis, ele e eu vindo ou voltando a ter interesses na área da religião, me perguntou sobre o tema dos “desigrejados”, que está a interessa-lo – e que, por dever de ofício, deveria estar a me interessar também, embora tenha concentrado minha atenção, dentro da área da História da Igreja e do Pensamento Cristão, mais em questões antigas do que contemporâneas. Rascunhei uma resposta rápida, mas me lembrei do artigo.

Verifiquei no meu blog, e, por uma omissão injustificável, o artigo não estava lá. Encontrei-o na seção “My Writing” de um disco rígido de backup, que possui quatro teras de espaço de armazenamento e que destinei a servir de quarto de despejo de coisas que um dia gostaria de rever. Vou publica-lo a seguir na versão que enviei para a ECA/USP, só corrigindo a ortografia, para a que se adapte às regras atuais, e colocando uma ou outra nota, em colchetes. Aqui vai.

o O o

A expressão “realidade virtual”, embora cunhada recentemente [Nota de 2017: a primeira versão do artigo é de 1993], se refere a algo que, em certo sentido, sempre foi do conhecimento de todos. Os acontecimentos descritos em obras literárias de ficção ou exibidos na maioria das peças de teatro, filmes, e novelas representam uma “realidade virtual” — isto é, uma realidade que, conquanto não exista no plano “real”, existe no plano “virtual”, isto é, imaginado ou potencial.

O existir da realidade virtual é um existir em um sentido válido, embora fraco, do termo. Os acontecimentos dessa realidade virtual (livros de ficção, peças, filmes, novelas) sem dúvida afetam nossas vidas, nos emocionam, não raro nos transformam. Algumas pessoas, principalmente as mais simples, confundem essa realidade virtual — que, por paradoxal que pareça, é uma “realidade não-real” — com a “realidade real” — por redundante que soe essa expressão. É por isso que elas detestam determinados atores porque os personagens que eles representam na tela geralmente são maus, ou que elas se decepcionam quando descobrem que a vida pessoal de um ator não se coaduna com a imagem de integridade identificada com o personagem que ele encarna na tela.

Se a expressão “realidade virtual” se referisse, hoje, somente àquilo que tradicionalmente chamamos de ficção, e que, embora afete nossas vidas, o faz apenas através da imaginação, seria difícil entender porque essa expressão vem aparecendo com tanta frequência nas revistas, especializadas ou não, e mesmo nos jornais, seja na sua forma original (“realidade virtual”), seja em formas derivativas (“escritório virtual”, “loja virtual”, “shopping center virtual”, “livraria virtual”, “banco virtual”, “dinheiro virtual”, “empresa virtual”, “conferência virtual”, “sala de reuniões virtual”, “biblioteca virtual”, “cinema virtual”, “jornal virtual”, “comunidade virtual”, “grupo de trabalho virtual”, “turismo virtual”, “férias virtuais”, “sexo virtual”, etc.). [Hoje, 2017, poderíamos acrescentar “igreja virtual].

O sentido da expressão “realidade virtual” (e de suas formas derivativas) não tem, hoje, entretanto, essa conotação de fictivo, apenas imaginado. Quando hoje falamos, por exemplo, em “shopping center virtual”, não estamos nos referindo a um shopping center que existe apenas na ficção ou na imaginação, e, portanto, apenas em um sentido fraco do termo do “existir”. Estamos nos referindo, isto sim, a um shopping center que existe em um sentido forte do termo, ainda que sua existência ou realidade não possa ser delimitada precisamente em termos espaço-temporais. Tanto o shopping center virtual de hoje existe que é possível nele fazer compras, e as compras nele feitas não são “de faz-de-conta”: são “realmente reais”, tanto que são, de fato, entregues na casa de quem as comprou, que, por elas, tem de pagar — ainda que com o que poderia ser chamado de “dinheiro virtual” (como, por exemplo, um cartão de crédito ou de débito).

A realidade dita virtual de hoje é, portanto, uma realidade que se distingue, conceitualmente, do reino do ficcional e do imaginário. O que a torna diferente da realidade comumente vista como tal é o fato de que a realidade virtual é uma realidade tornada possível pela revolução da informática — dos computadores e das telecomunicações.

A virtualização da realidade de que trata este artigo pode ser bem ilustrada no caso da chamada “comunidade virtual”. O termo “comunidade” tem vários sentidos. Seu sentido principal, porém, talvez seja o que faz referência a um grupo social cujos membros habitam uma determinada região e, em alguns casos, possuem memória e características comuns que individualizam o grupo e lhe dão identidade. Em comunidades pouco coesas talvez a única característica comum do grupo seja o fato de habitar uma determinada região. Mas em geral as pessoas fazem suas amizades na comunidade em que vivem e essas amizades não raro refletem interesses comuns (i.e., “comunidade de interesses”).

Uma comunidade virtual, no sentido em que a expressão se emprega hoje, é uma comunidade constituída por pessoas que não habitam necessariamente uma mesma região, mas que se encontraram e se mantiveram unidas através de computadores e telecomunicações — isto é, através das muitas redes de telecomunicações que hoje interligam os usuários de computadores. Os membros de uma comunidade virtual podem habitar até mesmo continentes diferentes e viver em locais distantes uns dos outros vários fusos horários. O que os une é apenas uma comunidade de interesses, e o interesse comum às vezes é, pelo menos no início, simplesmente encontrar outras pessoas também curiosas em aprender a se comunicar através de seus computadores. Outros interesses comuns rapidamente aparecem, e os grupos às vezes se quebram em grupos menores para discutir tópicos que só interessam a alguns dos membros do grupo maior. De qualquer forma, é impossível negar que essas comunidades — virtuais, porque transcendem o plano espacial, e, em certo sentido, também o temporal, visto que a comunicação entre seus membros é assíncrona — sejam comunidades reais, em que as pessoas genuinamente se interessam umas pelas outras, dão suporte (na forma de informação, conhecimento, apoio emocional e até mesmo auxílio financeiro) umas às outras, por vezes se desentendem, e, em alguns casos, até mesmo se apaixonam. (Se o interesse pessoal, ou, quem sabe, o amor, leva membros da comunidade virtual a se encontrarem face-a-face, uma comunidade não-virtual por vezes se sobrepõe à virtual, criando interações humanas por vezes complicadas).

A comunidade acadêmica e científica, que, a despeito de não habitar uma mesma região, já era chamada de comunidade mesmo antes dos computadores e das telecomunicações (já sendo, portanto, em certo sentido, virtual), sendo chamada de “community of scholars”, é hoje eminente e paradigmaticamente virtual, no sentido de que seus membros se comunicam, primária e fundamentalmente, através de seus computadores e das redes criadas para interligar esses computadores, em especial através da Internet, a rede das redes de computadores instalados em instituições acadêmicas e de pesquisa e desenvolvimento. [Nota de 2017: Em 1993 é isso que era a Internet. Foi nesse ano que ela começou a se desvincular da comunidade acadêmica e se tornar universal]. Não vai nenhum exagero ao dizer que muitos pesquisadores hoje têm mais e melhores relações com pesquisadores com os quais mantêm principalmente encontros virtuais, através da Internet, do que com pesquisadores da mesma instituição, cujas salas ou laboratórios às vezes estão no mesmo prédio ou corredor.

Conferências científicas em regra envolvem, ainda hoje, encontros face-a-face, e, portanto, não podem ser chamadas de virtuais. Mas a organização e o preparo dessas conferências geralmente são feitos por grupos de trabalho virtuais, cujos membros estão a milhares de quilômetros de distância uns dos outros, comunicando-se quase que exclusivamente por correio eletrônico. Os trabalhos científicos a serem apresentados nessas conferências e reuniões são enviados pela rede para o comitê organizador, que os distribui, também pela rede, a avaliadores, que devolvem seus pareceres pelo mesmo meio. É de esperar, porém, que aumente o número de conferências científicas totalmente virtuais, em que os participantes permanecem em seus próprios locais de trabalho ou em suas próprias casas e se reúnam pela rede, através dos textos por eles escritos (teleconferência), ou através discussão oral de seus textos (teleconferência com áudio), ou até mesmo através de vídeo-teleconferência, que vem sendo paradoxalmente descrita como uma forma de “telepresença”. [Nota de 2017: essa profecia se cumpriu na totalidade. Hoje em dia participo de várias conferências dessa forma virtual. A ênfase, em negrito, foi acrescentada agora.]

Na verdade, o chamado correio eletrônico é um correio virtual, pelo qual circulam correspondências eletrônicas. Contudo, seria um erro considerar o correio eletrônico apenas uma recriação digital do correio e das correspondências convencionais. A virtualização do correio acrescentou-lhe dimensões importantes, não existentes antes. Muitas dessas dimensões representam nítidas vantagens. Em primeiro lugar, a transmissão das mensagens e, portanto, a comunicação, é muito mais rápida — virtualmente instantânea. Em segundo lugar, uma mesma mensagem pode ser enviada para vários destinatários simultaneamente. Em terceiro lugar, e mais importante, uma mensagem pode, hoje, em muitos casos, incluir som (a voz humana, por exemplo) e até mesmo imagens (um vídeo de quem está mandando a mensagem, por exemplo).

Por outro lado, a transmissão de mensagens por cabos convencionais, fibras ópticas ou via satélites coloca sérias questões de segurança, confidencialidade e privacidade que já foram adequadamente equacionadas no correio convencional. Além disso, com a comunicação, sem fios, entre computadores, que hoje começa a se viabilizar e até mesmo a se popularizar [Nota de 2017: o leitor deve se lembrar de que o texto original é de 1993], a correspondência das pessoas literalmente circulará pelo espectro eletromagnético, com seus textos, sons, e imagens digitais, fato que complica ainda mais o problema da segurança, confidencialidade e privacidade da comunicação.

© Copyright by Eduardo Chaves, 1993, 1999

o O o

Volto a escrever no presente, em 2017.

Acrescento, a seguir, um breve artigo que escrevi para a revista Visão, da Catedral Evangélica de São Paulo, sobre o tema da “Igreja Virtual”. O título do artigo é “A Igreja Como Comunidade Virtual dos Crentes”. Na verdade, já ministrei, em duas ocasiões, no mês de Julho, como parte de um programa chamado “Faculdade Aberta”, um curso de três dias sobre a temática da Igreja Virtual. O artigo é decorrente dessa iniciativa.

Transcrevo-o aqui: é um artigo bem curto, como ditam as regras da revista.

o O o

A Igreja como Comunidade Virtual dos Crentes

Eduardo Chaves (*)

Frequentamos a igreja, em regra, uma vez por semana, com vários objetivos: adorar a Deus, fortalecer a fé, aprender mais sobre a Bíblia, ter comunhão com os irmãos.

Vou me concentrar inicialmente na comunhão entre os irmãos.

A tecnologia atual nos permite ver a igreja como uma comunidade também virtual, sem limitações espaço-temporais. Nessa visão, a igreja (diferentemente do templo) deixa de ser um lugar físico que se frequenta uma vez por semana para se tornar a comunidade daqueles que comungam uma mesma fé e prática e consideram importante estar em comunhão uns com os outros.

A comunhão presencial que acontece na visita semanal ao templo é muito limitada: a igreja deveria estar presente na vida das crentes também nas horas que passam longe do templo. Na verdade, o tempo todo.

As tecnologias hoje disponíveis tornam isso possível.

Em seu livro The Church of Facebook Jesse Rice sugere que as tecnologias atuais estão abalando a ideia tradicional de comunidade. Hoje milhões de pessoas se conectam umas com as outras através das redes sociais, trocam informações, fazem amizades, cultivam relacionamentos, até mesmo se apaixonam, apoiam os que estão deprimidos, discutem, aprendem… As redes sociais nos permitem estar o tempo todo sintonizados com nossos amigos, acompanhando suas ações, compartilhando suas alegrias e tristezas… Elas tornam possível um nível de comunhão entre amigos inimaginável até há pouco tempo…

Irmãos na fé são mais do que amigos, não é mesmo?

Se Martin Buber estava minimamente certo ao dizer que Deus não está aqui ou ali, mas entre um e outro, a comunhão com o próximo é a principal forma de nos aproximarmos de Deus.

É possível também agregar ao virtual os demais objetivos da frequência ao templo, como,  por exemplo, a adoração a Deus. Hoje, na Primeira Igreja, já temos irmãos que nunca vemos presencialmente: os que de longe assistem aos nossos cultos pela Internet. Eles poderiam se integrar a essa comunidade virtual de comunhão e, também, de adoração. Os muito idosos, os doentes, os presos ao leito ou à casa, poderiam também se sentir visitados diariamente pela presença envolvente da igreja…

Também a educação cristã se beneficiaria dessa igreja virtual. Numa comunidade assim poderíamos aprender, não tanto pela via do ensino e da instrução, mas, sim, pelo compartilhamento de ideias, do diálogo que nos faz crescer e propicia o nosso desenvolvimento como seres humanos, da discussão que aprofunda o nosso entendimento, porque nos permite compreender melhor o mundo, a vida, a nós mesmos, quiçá a Deus.

A igreja, assim redefinida, seria igualmente um ambiente de crescimento, se não na fé, em si, pelo menos na sua compreensão, na sua articulação com a vida diária, nas suas implicações para a conduta no trabalho, no lazer, na vida doméstica.

Quem sabe a criação, para a Primeira Igreja, de uma comunidade virtual seria um primeiro passo para o surgimento de uma igreja que transcenda os limites do centro histórico da cidade, e mesmo, pioneiramente, os da cidade em si, e se torne um ambiente amplo de comunhão, adoração e formação, 24 horas por dia, 7 dias por semana?

Para que isso aconteça, não basta criar uma comunidade virtual num site da Internet. É preciso ver a participação no site como parte integrante de nossa vida cristã e ver a coordenação do site como um ministério da igreja — ou como uma outra plataforma em que os atuais ministérios podem desenvolver o seu trabalho. O acolhimento de novos membros, de visitantes, dos que assistem ao culto pela Internet, poderia ser feito também nesse espaço virtual. Ali também poderiam ser divulgadas notícias e informações acerca de eventos que acontecerão na igreja e fora dela, aniversários, casamentos, doenças, falecimentos, trabalhos dos diversos ministérios, sociedades e fundações da igreja, etc.

Por último, mas não menos importante, a comunidade virtual poderia ser um posto avançado de evangelização que leva em conta o fato de que as pessoas, hoje, passam cada vez mais tempo no espaço virtual.

(*) Eduardo Chaves, professor aposentado de Filosofia da UNICAMP, é, com sua mulher Paloma Epprecht Machado de Campos Chaves, membro da Primeira Igreja.

© Copyright by Eduardo Chaves, 2011

o O o

Volto para 2017. Este artigo foi escrito, se não me engano, em 2011. Sei que não foi posteriormente, porque o nome da Paloma, mencionado na nota, ainda terminava no “Machado”…

Marcelo Girsas, a quem já fiz referência, me perguntou hoje (05/Jul/2017), pelo Facebook: “A propósito, tenho aprofundado um pouco sobre o tema ‘desigrejados’, e gostaria de saber se já ouviu a respeito?”

Respondi, de pronto, dizendo o seguinte (com pequenas edições):

“Conheço o tema, que tem merecido bastante discussão. Mas não o estudei a fundo. Tenho alguns livros que o discutem. Vou localiza-los e compartilhar a referência. Mas eu creio assim, sem ter estudado o fenômeno, que é uma característica típica de uma época em que, por causa da tecnologia, as pessoas aqui torcem para times na Europa, assistem a programas de canais de TV estrangeiros, não vão mais ao cinema e ao teatro, mas assistem a filmes e peças na tela, etc. Algo parecido acontece quando você se considera cristão mas não frequenta uma igreja específica, assistindo um culto aqui outro ali na TV, vendo um filminho no YouTube, discutindo algumas questões no Facebook… Muitas pessoas não frequentam mais escolas físicas, mas fazem cursos a distância mediatizados pela tecnologia, aprendem discutindo nas redes sociais, etc. As comunidades a que costumávamos pertencer, que eram, quase todas elas, ‘face-to-face’, vão sendo substituídas por comunidades virtuais, em que os relacionamentos são mediatizados pela tecnologia. Essa é a minha primeira impressão… É a “virtualização da vida”… Escrevi um artiguinho sobre isso faz muito tempo para a EAC da USP. Vou verificar se o acho.”

Bom, como está claro aqui, achei o artigo e me lembrei até mesmo do artigo escrito para a revista da Igreja… Acho que, com esses acréscimos, temos aqui uma pequena introdução, mais filosófica do que histórica ou sociológica, ao tema dos “desigrejados”. Depois acrescento mais referências à discussão desse tema de uma perspectiva histórica e sociológica – e quiçá teológica.

Em Salto, 5 de Julho de 2017

Uma resposta

  1. Meu amigo Eduardo Chaves, e porque não, irmão na fé em Cristo Jesus. Recentemente envolvi-me na discussão deste tema com alguns irmãos de fé.
    Usualmente o termo “desigrejado” tem sido aplicado aqueles que não tem se reunido ou congregado dentro de instituições religiosas formais (principalmente as denominações). Muito tem sido dito a respeito das razões que tem levado parcela significativa dos cristãos na atualidade a não mais frequentarem cultos nestas instituições religiosas, ou seja sentado nos bancos das congregações assistindo preleções ou sermões e demais atividades religiosas.
    Isso tem acontecido de forma significativa nos Estados Unidos da América do Norte (USA), e encontra adeptos em volume crescente em nosso pais.
    Segundo o reverendo Augustus Nicodemus, da Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia, existem razões para sustentação deste posicionamento dos chamados “desigrejados”, dentre os quais podemos citar resumidamente:
    1) Cristo não deixou qualquer forma de Igreja organizada e institucional.

    2) Já nos primeiros séculos os cristãos se afastaram dos ensinos de Jesus, organizando-se como uma instituição, a Igreja, criando estruturas, inventando ofícios para substituir os carismas, elaborando hierarquias para proteger e defender a própria instituição, e de tal maneira se organizaram que acabaram deixando Deus de fora. Com a influência da filosofia grega na teologia e a oficialização do cristianismo por Constantino, a Igreja corrompeu-se completamente.

    3) Apesar da Reforma ter se levantado contra esta corrupção, os protestantes e evangélicos acabaram caindo nos mesmíssimos erros, ao criarem denominações organizadas, sistemas interligados de hierarquia e processos de manutenção do sistema, como a disciplina e a exclusão dos dissidentes, e ao elaborarem confissões de fé, catecismos e declarações de fé, que engessaram a mensagem de Jesus e impediram o livre pensamento teológico.

    4) A Igreja verdadeira não tem templos, cultos regulares aos domingos, tesouraria, hierarquia, ofícios, ofertas, dízimos, clero oficial, confissões de fé, rol de membros, propriedades, escolas, seminários.

    5) De acordo com Jesus, onde estiverem dois ou três que creem nele, ali está a Igreja, pois Cristo está com eles, conforme prometeu em Mateus 18. Assim, se dois ou três amigos cristãos se encontrarem no Frans Café numa sexta a noite para falar sobre as lições espirituais do filme O Livro de Eli, por exemplo, ali é a Igreja, não sendo necessário absolutamente mais nada do tipo ir à Igreja no domingo ou pertencer a uma Igreja organizada.

    6) A Igreja, como organização humana, tem falhado e caído em muitos erros, pecados e escândalos, e prestado um desserviço ao Evangelho. Precisamos sair dela para podermos encontrar a Deus
    Penso que a Igreja de Cristo não precisa de templos construídos e nem de todo o aparato necessário para sua manutenção. Ela, na verdade, subsistiu nos quatro primeiros séculos se reunindo em casas, cavernas, vales, campos, e até cemitérios. Os templos cristãos só foram erigidos após a oficialização do Cristianismo por Constantino, no séc. IV.
    O reverendo Nicodemus, ainda estendendo seu pensamento declara: Os “desigrejados” estão certos ao criticar os sistemas de defesa criados para perpetuar as estruturas e a hierarquia das Igrejas organizadas, esquecendo-se das pessoas e dando prioridade à organização.
    Concordo com eles que não podemos identificar a Igreja com cultos organizados, programações em fim durante a semana, cargos e funções como superintendente de Escola Dominical, organizações internas como uniões de moços, adolescentes, senhoras e homens, e métodos como células, encontros de casais e de jovens, e por aí vai. E também estou de acordo com a constatação de que a Igreja institucional tem cometido muitos erros no decorrer de sua longa história.
    Pensando menos em uma teologia complexa, desenvolvida sobre extensos pensamentos filosóficos e atentando básicamente a uma exegese bíblica simples, vejamos:
    1) A Igreja é o corpo de Cristo (I Cor 12:12)(Rm 12:5)
    2) A Igreja é formada por pedras vivas (os que creem) (I Pe 2:5)
    3) Logo a Igreja não é um prédio ou edificação humana
    4) A Igreja cresce como um organismo vivo (Ef 2:21)
    5) A princípio, uma vez tendo sido eleito e predestinado e tendo recebido a salvação pela graça, somos parte deste corpo vivo, desta edificação viva
    6) Tendo sido gerados por Deus, nascidos de novo (Jo 3:3-5), isso implica que temos uma relação com o Deus que nos gerou, não podemos mais perder esta relação, inclusive Jesus afirma que “nenhum daqueles que o Pai lhe deu se perderiam de suas mãos” Jo 6:37
    7) Hora, perde o filho a relação parental de filho ao abandonar o pai? Presumindo que Deus não o deserda? Certamente que não.
    Chego a conclusão que o termo “desigrejado” exprime equivocadamente a condição daqueles que na verdade, eventualmente, não estão congregando em alguma religião cristã formal. Podemos não congregar, mas não podemos deixar de ser membro do corpo de Cristo, uma vez tendo recebido a salvação, e por implicação não podemos deixar de pertencer a Igreja, logo não podemos estar “desigrejados”.
    Hoje percebo muitos destes assim chamados “desigrejados”, reunindo-se nos lares, vivenciando a experiencia da Igreja dos primórdios do primeiro século da era cristã, assim sendo como classifica-los como “desigrejados”?
    Pondero desta forma não ser coerente chama-lo de “desigrejados”, mas é possível estarem “descongregados”, se é que este é um termo possível.

    Curtir

    • Meu caro Marcelo,

      Estou na praia, com uma Internet bastante precária. Procurarei responder assim que voltar para a “civilização”… 🙂 Mas a questão agora extrapolou a dos desigrejados, como tal…

      Um abraço.

      Curtir

Deixe um comentário